Sociedade
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#COMENTÁRIO
Poder-se-ia chamar de um estudo
aprofundado sobre a matéria, mas trata-se de um documento criado por Simon Schwartzman,
ex-diretor do IBGE. Deveria esta matéria se tornar um manual de processo para
os envolvidos no ensino brasileiro em níveis superiores.
Mais que os números citados nos dizem, o
documento representa os anseios de muitos brasileiros que ainda se preocupam
com educação no Brasil e suas consequências. É muito fácil pensar e projetar
qual futuro nos espera com base nos recém-formados e suas indescritíveis ignorâncias.
Outro fator abordado na matéria e de
grande relevância, trata-se do grau de instrução e conhecimento dos próprios
professores. Não se pode generalizar, mas podemos afirmar com toda certeza que
a grande maioria dos professores de base, escondem-se em desculpas de
dificuldades, de má remuneração, de não reconhecimento, de transferência de
responsabilidades dos pais. Essas reivindicações e reclamos, não podem ser
ignorados e realmente deveriam ser atendidos pelos governos estaduais e
municipais, porém há que somar a eles o desânimo e falta de vontade de se
vestir a camisa do professor, como faziam os antigos professores, nossos
mestres, que ainda permanecem em nossa memória.
Aos que já estão na casa dos sessenta
anos de idade podem entender a que estamos nos referindo. As dificuldades poderiam
ser até maiores, a remuneração poderia ser até menor, mas havia respeito, muita
força de vontade de professores e alunos. As dificuldades eram ultrapassadas a
todo custo, não parava para lastimar como hoje se faz, não havia tempo para se
envolver em sindicatos e pensar em greves reivindicatórias; os professores se
comprometiam com sua profissão, que tinham muito orgulho de pertencer, com seus
alunos, que queriam vê-los cada vez mais cultos e preparados para a vida.
Isso é que mais falta ao ensino do
Brasil, professor.
#Disse
Carlos Leonardo
Fonte: Folha
de São Paulo
#CONVITE
Não acha que acima de tudo o que falta é
professor não simplesmente tias?
Dê sua opinião (clique no título da matéria para comentar).
SIMON SCHWARTZMAN - ESPECIAL
PARA A FOLHA - 07/12/2014
34% dos brasileiros, segundo pesquisa do Ibope de
2010, consideravam a educação pública brasileira ótima ou boa, e 44%, regular;
21% achavam que era péssima.
Enquanto isso, os dados do Pisa, a pesquisa
internacional da OCDE sobre a qualidade da educação, mostravam que, dos 47% dos
jovens de 15 anos que conseguiam chegar ao fim da escola fundamental ou início
da média, 67% não tinham os conhecimentos mínimos de matemática esperados para
a série, 18,8% não tinham a capacidade mínima de leitura e 54% não dominavam os
conceitos básicos de ciência. Ficaram para trás ou desistiram de estudar 53%.
Aos 18 anos, em 2012, somente 27% dos jovens haviam
conseguido chegar ao final do ensino médio ou haviam entrado no ensino
superior, e metade já havia deixado de estudar. Quem olha os dados vê a
tragédia em curso, mas a maioria da população, talvez por ter conhecido dias
piores, não enxerga o problema. As crianças começam a desenvolver vocabulário e
capacidade de lidar com números muito cedo e, se o ambiente familiar não
favorecer, podem ficar prejudicadas por toda a vida.
TRAJETÓRIA
Uma boa pré-escola pode ajudar, se não for só um
depósito de crianças para as mães que trabalham. Aos 6-7 anos, todas as
crianças deveriam estar lendo fluentemente, se os professores usassem os
métodos adequados de alfabetização. Mas os professores não sabem, ou são contra
esses métodos, e muitos estudantes permanecem para sempre analfabetos
funcionais. Nos primeiros cinco anos da escola fundamental, os estudantes
dependem de um único professor, que deveria enriquecer o vocabulário e a
capacidade de leitura das crianças, familiarizá-las com os números e introduzir
os conceitos iniciais das ciências naturais, história e geografia. Professores
e professoras, como pessoas, são modelos de adultos que as crianças vão
rejeitar ou emular.
Mas muitas vezes eles não dominam os conteúdos, não
passaram por um bom curso para aprender as melhores práticas de ensino e não
conseguem estabelecer com os alunos a relação emocional e de trabalho sem a
qual a educação não ocorre. A partir da 6ª série essa pessoa de referência
desaparece, sendo substituída por diferentes professores de português,
matemática, história, ciências, com suas qualidades e defeitos, nem sempre bem
formados. Com 11 anos, resta ao aluno achar o seu caminho nesse emaranhado. Se
ele chegou bem até aí, e se a família puder ajudar, consegue ir adiante,
estudando mais algumas matérias do que outras, quem sabe se interessando por
algumas, e decorando o que precisa para passar de ano. Aos 16-17 começa a
treinar para o Enem, cujos resultados são conhecidos de antemão: os alunos de
boas escolas privadas ou das poucas públicas seletivas, que vêm de famílias
mais educadas, conseguem boas notas e uma das 200 mil vagas em universidades
públicas. Aos demais - cerca de 8 milhões - cabe quem sabe a chance de voltar
para o ensino médio, para um curso do Pronatec ou se matricular em uma
faculdade particular paga e de qualidade desconhecida. A grande maioria, no
entanto, não chega lá: não entende bem o que está fazendo na escola, não
consegue acompanhar os cursos e, quando chega aos 14 ou 15 anos, desiste de
estudar.
PAPEL DA ESCOLA
As escolas não podem, sozinhas, corrigir as
desigualdades socioeconômicas, nem as grandes diferenças de interesse,
motivação e talento que existem em todos os níveis sociais, mas ajudam muito se
funcionarem como devem. Anos de pesquisa no Brasil e no mundo já permitem saber
o que faz uma boa escola e um bom sistema de ensino.
Não existe bala de prata, mas várias coisas que
precisam ser feitas ao mesmo tempo. A escola precisa ser uma comunidade
comprometida com seus fins e, para isso, precisa de um diretor que entenda sua
missão, seja capaz de liderar os professores, se relacionar bem com a
comunidade e mostrar resultados. Os professores precisam conhecer bem o que
devem ensinar, dominar as técnicas e procedimentos pedagógicos adequados a cada
nível de ensino, gostar e estar comprometidos com os resultados de seu
trabalho. Os alunos precisam encontrar na escola um ambiente estimulante, ter a
possibilidade de um atendimento individualizado, na medida de suas
necessidades, e o tempo de permanência das crianças na escola deve ser mais
longo: ao menos seis horas diárias.
Se, nos anos iniciais, todos os estudantes precisam
passar pelo mesmo tipo de educação, a partir do ensino médio é preciso entender
que eles são diferentes e organizar o sistema educativo para lidar com essas
diferenças.
CURRÍCULO ABSURDO
O currículo do ensino médio brasileiro, com 15 ou
mais disciplinas obrigatórias, é claramente um absurdo, mas a solução não é
fazer um currículo mais "enxuto" ou "interdisciplinar", e,
sim, abrir a possibilidade de escolhas e modernizar os conteúdos. Algumas
competências mais gerais, como as de escrita e leitura, o raciocínio matemático
e o inglês, precisam ser reforçadas para todos, ainda que adaptadas aos
diversos perfis de formação.
Para os que pretendem se candidatar à universidade,
deve ser possível se aprofundar em temas nas áreas de interesse principal - química,
eletrônica, computação, biologia, meio ambiente, estatística, direito,
economia. Para a grande maioria, que não tem condições ou não quer cursos
universitários tradicionais, deve haver cursos técnicos de qualidade, em áreas
como serviços de saúde, processamento de dados, mecânica, eletrônica e outros,
que garantam uma certificação reconhecida pelo mercado de trabalho e ao mesmo
tempo um título de nível médio que permita continuar os estudos depois em
cursos superiores ou tecnológicos avançados. O ensino técnico e profissional só
pode dar certo se contar com a participação ativa do setor empresarial,
ajudando a formular os currículos, oferecendo equipamentos para as escolas,
participando dos sistemas de certificação profissional e oferecendo
oportunidades de aprendizagem prática supervisionada, que é muito diferente do
uso de estagiários como mão de obra barata.
O Enem precisa ser substituído por certificações e
avaliações específicas dos diferentes tipos de formação.
A questão é como passar da situação atual para a
desejável. Para isso, é preciso recursos, mas, sobretudo, vencer as barreiras
mentais e os interesses corporativos que impedem que as melhores soluções sejam
buscadas, e, principalmente, que a população deixe de ser tolerante com a
péssima qualidade da educação e comece a exigir resultados.
SIMON SCHWARTZMAN
Doutor em ciências
políticas pela Universidade da Califórnia - Berkeley, é presidente do Instituto
de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS) e ex-presidente do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
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